Há ninhos no meu peito
Das aves que em mim poisaram, no meu corpo feito árvore
Na minha alma feito cama
Estendo os lençóis brancos, para que a pureza não desvaneça
Nem o escuro me amedronte
Ainda existem papões no sótão da minha memória
Abro a porta devagarinho, empenada,ruge ao mais pequeno movimento
E eu encolho-me não vá o papão acordar
Afasto as cortinas de teia de aranha, e o sol da manhã encosta-se nos beirais...na prontidão de um segundo investe contra a escuridão,clareando toda a minha mente
Não foi desta que o bicho papão me torturou
Mas ele espera, tem todo o tempo do mundo, há-de morrer depois de mim, jurou e cumprirá
Não sei de mim, nestes becos da minha alma ensanguentada,ferida,dolorosa fria
Não sei do meu sorriso de criança.Comeria-o o papão?
E nestes pensamentos absurdos de uma mente que não mente, busco desesperadamente a luz do sol que me leva ao mais belo lugar do mundo
Ainda ouço ao longe o baloiço da minha laranjeira, e os meus olhos estão lá,de cabeça para cima,vejo as laranjas por entre o azul do céu.
Parece que elas nascem das nuvens
Busco desesperadamente o silêncio para que aquela voz de anjo ressalte aos meus ouvidos uma voz doce e firme,chamando por mim
E eu corro, pés descalços, e nas mãos a esperança de um aconchego, de um beijo, de uma ternura sem par
Melhor que isso os braços de minha mãe erguendo-me no seu colo
Não há papão que me encontre, nem fantasma que me apavore,não há casa mais bonita do que o coração da mãe.
A pobreza tem algo de nobre,tem a simplicidade e a humildade daquilo que verdadeiramente somos
Morar no coração da mãe é morar nos braços de Deus, é aqui que existe a maior riqueza da vida,o SER!
E mesmo que ela se ausente pela eternidade, ela nunca nos deixa sem casa,porque mãe é infinita
E sempre que o papão espreita, há uma luz que o cega
Há ninhos de amor no meu peito, com fios de saudade que apertam até sufocar.
E nesse sufoco há o tilintar dos sinos, de anjos que se ajoelham em roda da minha alma, acalmando as minhas feridas, atenuando a minha dor...
R.M.Cruz
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